Chega um ponto em que quem faz negócios no Brasil acha que já viu de tudo: inflação, crises cambiais as mais diversas, recessões típicas de guerra, mas em períodos de paz. Isso tudo tendo o tradicional pano de fundo de um Estado gigantesco, um polvo cheio de tentáculos que finge querer ajudar, mas só atrapalha. Eis que chegamos a 2020 e diante de uma crise, de fato, que ninguém imaginou encontrar. Uma crise que combina aspectos globais e é potencializada por nossos desencontros políticos, pela falta de lideranças. O resultado é um mergulho econômico que certamente assusta a todos – e que torna a missão da nossa indústria, hoje e no futuro, ainda mais importante do que já era.
Não tenho dúvida de que ter como sócios investidores de Private Equity e Venture Capital ajuda as empresas brasileiras a atravessar melhor essa tormenta. Nossa indústria é formada por gente experiente, com mestrado e doutorado em Brasil real – mesmo tendo passado por tantas crises, ajudamos a impulsionar as empresas, demos retorno aos nossos investidores e deixamos nossa marca na economia brasileira. Para o empreendedor, essa experiência vale muito. Nós sabemos que toda crise passa, e que é fundamental evitar o pânico e se concentrar naquilo que está sob o seu controle – as pessoas, o caixa, os clientes. Nessa hora, aquela combinação de governança, experiência, capital de longo prazo que divide os riscos e acesso às melhores práticas de que tanto falamos vale ainda mais do que em tempos normais.
Temos conversado sobre as ações tomadas por cada um de nós para ajudar nossos sócios e os times das empresas investidas, e isso só prova a força, a resiliência e a importância das gestoras de Private Equity e Venture Capital.
Mas gostaria de aproveitar essa chance para falar do futuro.
A reação à crise vai acelerar alguns fenômenos que já estavam acontecendo. Um deles é o esgotamento da capacidade fiscal do nosso Estado. Num movimento necessário para amenizar o sofrimento das famílias, nossa dívida vai aumentar ainda mais. Nessa hora, começam a reaparecer ideias que julgávamos enterradas, como a impressão milagrosa de dinheiro, além de outras falsas soluções. Fala-se pouco da única certeza que de fato temos: a economia brasileira depende do capital privado para se recuperar.
A indústria global de Private Equity e Venture Capital tem mais de dois trilhões de dólares para investir. Seria de esperar que o nosso governo estivesse fazendo o possível para atrair esse capital de longo prazo – para revitalizar nossa infraestrutura, comprar estatais, fazer nossas startups decolarem, atrair sócios de qualidade para as empresas já estabelecidas. Não precisamos de muito. Regras claras, segurança jurídica: é o básico. Mas, infelizmente, temos sido tratados como agentes do mal pelo governo, que ainda não entendeu quão importantes podemos ser.
Vocês têm acompanhado, no último ano, essa jornada um tanto inglória. A ABVCAP não mede esforços na tentativa de convencer o governo a desatar os nós que travam os investimentos de longo prazo no Brasil. É frustrante às vezes, mas não perco as esperanças. É uma briga justa, e vamos continuar brigando. Temos tentado levar à sociedade brasileira a mensagem da importância das nossas empresas no dia a dia do cidadão, no mercado de capitais, importância esta que não é clara a muitos no país.
Talvez precisemos mesmo de uma crise desse tamanho para que se constate o óbvio. Nossa indústria é madura, temos mais de duas décadas de história, fundos estrangeiros e brasileiros com equipes de primeira linha, prontos para multiplicar seus investimentos num momento em que o capital de longo prazo é mais importante do que jamais foi. Podemos atrair muito mais investimentos do que temos feito. O ecossistema existe, está formado, provado. Incompreensível como pode ser ignorado ou até hostilizado por quem mais deveria compreendê-lo.
A indústria de Private Equity e Venture Capital está ajudando as empresas brasileiras a sobreviver nesse momento difícil – e, como aconteceu em outras crises, também vai ajudar o país a voltar a crescer.